Peer to peer e crowdfunding surgem como alternativas de capitalização

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Por Daniel Caravetti

A insegurança econômica que se instalou no Brasil alterou a realidade de empresas de diversos segmentos, incluindo as do mercado imobiliário. Com queda brusca da bolsa de valores e a fuga de capital de alguns fundos de investimentos imobiliários (FIIs), além da menor demanda do mercado, muitas construtoras e incorporadoras têm passado por dificuldades financeiras. Neste cenário, operações de peer to peer lending e crowdfunding despontam como solução para capitalização e financiamento de projetos.

Qual a diferença?

Gabriel Nascimento, fundador da Ulend, uma fintech que conecta investidores pessoas físicas a empresas, explica a diferença entre os dois modelos. A startup trabalha no modelo peer to peer, com empresas de qualquer ramo do mercado, tendo poucas incorporadoras ou construtoras na carteira. Uma delas atua com escritórios comerciais e habitações populares.

“Enquanto no peer to peer o investidor é um credor da empresa, no crowdfunding ele investe em uma cota da empresa e vira sócio-investidor da companhia”, diz em entrevista à Smartus. Desse modo, no Brasil, o crowdfunding se trata de uma oferta pública de valor imobiliário, necessitando registro na CVM (Comissão de Valores Mobiliários) através da instrução 588, que regula as plataformas eletrônicas de investimento participativo. 

“Na prática, como o peer to peer se trata de um empréstimo, a empresa tem que demonstrar um mínimo de fluxo de caixa para conseguir arcar com a dívida. No caso de incorporadoras, pode se colocar imóvel como garantia, mas a principal segurança do investidor é própria capacidade de pagamento da empresa. Em geral, a concessão de crédito não passa de 35% do faturamento anual da empresa”, afirma Nascimento.

“Já no crowdfunding, o investidor deve acreditar em determinado produto daquela empresa, não sendo tão dependente da capacidade de pagamento dela, já que pode vender a sua participação. De qualquer maneira, quando se trata de uma incorporadora que tem fluxo de caixa, experiência com muito empreendimentos e histórico no mercado, existe a possibilidade de captar recursos pelos dois modelos”, completa.

A Ulend tem obtido maior procura de empresas durante a pandemia. Segundo o fundador, as solicitações de empréstimos – que tinham média de até R$ 60 milhões mensais – dobraram. Por outro lado, a aversão ao risco por parte dos investidores fez o volume de financiamentos cair pela metade. Trata-se de um cenário com muita demanda e pouca oferta de crédito. 

Peer to peer no setor imobiliário?

Especificamente no mercado imobiliário, Nascimento crê que o modelo peer to peer tem espaço para crescer, mas exige a presença de investidores de longo prazo: “Hoje em dia, os credores têm preferências por operações de até 24 meses, como os bancos. Uma vez que este mercado lida com a construção de empreendimentos, precisa de mais tempo, estando mais próximo de um prazo de 48 meses. Há de se encontrar investidores dispostos a manter seu dinheiro aplicado por todo esse período”.

No Brasil, já existem empresas que atuam no modelo peer to peer exclusivamente para o mercado imobiliário. Um exemplo é a Urbe.me, que inicialmente operava via crowdfunding, mas não utiliza mais o modelo. Atualmente, a plataforma de investimento oferece o financiamento coletivo de empreendimentos imobiliários através de empréstimos às incorporadoras. O sócio-fundador Lucas Obino explica a mudança.

“O valor permitido no legítimo crowdfunding é muito baixo para a incorporação, restrito a grupos econômicos com faturamento menor que R$ 10 milhões, o que é impraticável para incorporadoras mais consolidadas. No modelo peer to peer, somos vinculados a uma renda fixa com uma cota de taxa conforme performance. Desse modo, atuamos através de uma instituição financeira, como exige o Banco Central, e podemos financiar empresas maiores”, afirma para a Smartus.

O executivo também esclarece como funciona o retorno para os investidores da Urbe.me, que normalmente não trabalha com operações que utilizam imóveis como garantia: “Em nosso modelo regulatório, geralmente existe um valor pré-fixado, vinculado à CDI, e depois ocorre uma troca de taxa por participação do VGV. Assim, o investidor fica com o valor maior entre eles. Já que atua como um credor, se o empreendimento não der certo, o investidor ganha um crédito”, explica.

É importante ressaltar que a empresa busca atuar em uma etapa anterior ao financiamento bancário, minimizando a concorrência dos bancos, que preferem liberar capital no momento em que a obra já está construída ou vendida. De acordo com o sócio-fundador, através de taxas mais baratas, o financiamento coletivo substitui o papel de um grande investidor.

Pandemia

No início da pandemia, em março, a Urbe.me decidiu interromper as captações para entender melhor o rumo que o mercado tomaria. Contudo, há cerca de um mês, após uma análise mais ampla, a plataforma de investimentos voltou a atuar com os produtos que acredita ter boas performances mesmo na crise.

“Um dos segmentos que estamos dando prioridade é o econômico, que está acostumado a trabalhar com escassez de recursos e clientes de baixa renda, além de contar com o déficit habitacional enorme que ainda existe”, explica Obino.

“O outro é o altíssimo padrão, que pouco sofre com a oscilação de mercado e se beneficia do movimento de procura por residências maiores, impulsionado pela menor utilização dos espaços públicos e pela consolidação do home office”, completa. Recentemente, inclusive, a empresa abriu uma captação para um condomínio de casas de alto padrão na cidade de São Paulo. 

O executivo também garante que nas duas últimas semanas a procura pela plataforma voltou ao patamar natural: “Há um equilíbrio. Se o mercado como um todo está cauteloso, o nosso modelo está sendo bem visto pois trabalha com imóveis, o ativo mais sólido da economia real. Pegamos um público intermediário entre investidores de renda fixa e bolsa de valores. As incorporadoras também seguem em contato conosco normalmente”. 

Crowdfunding imobiliário

Também observando a necessidade de novas opções de capitalização para o setor imobiliário, a consultoria Swiss e a construtora Alves Lacerda fecharam parceria para um financiamento coletivo imobiliário. A plataforma utilizada será a Invest Web e o crowdfunding deve ser aberto aos investidores em menos de 40 dias, com investimentos a partir de R$ 5 mil e rendimentos de até 350% do CDI (18 meses).

O CMO da Swiss, Alex Silva, fala sobre o crescimento da modalidade em meio à crise: “Por um lado, construtoras buscam formas inovadoras e mais atrativas de captar recursos do que as oferecidas pelo mercado tradicional. Por outro, os investidores buscam boas remunerações, além de diversificar a carteira, por segurança. Emprestar dinheiro para empreendimentos de construtoras se tornou um ótimo negócio”, afirma.

“A vantagem desse tipo de parceria é que vamos rentabilizar pequenos investidores e pessoas comuns, em vez de instituições tradicionais, como alguns bancos que exigem muito e entregam pouco em relação a juros, burocracia e prazos. Como consultor, vejo que, em breve, o blockchain também entrará forte nesse mercado de crowdfunding, porém os formatos de cotas passarão a ser tokens (STO)”.

Tags: peer to peer, crowdfunding, economia

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